22.11.16

vaga-lume, pois...

Esse vazio que cabe aqui
como um branco no papel,
é só exemplo, meio caminho
vaga-lume vagando por aí
Quero voltar óh vaga-lume
só peço luz e um pouco de palavras
que sejam prontas, feitas, mágicas
Senhor vaga-lume, seja rei, seja assim
Sem olhar para mim, sabendo que sou fim
deixa que saiam assim, letrinha após letrinha,
jovens, ingênuas, uma atrás da outra fazendo palavrinhas
me basta, me enche, me gasta
peço pouco, peço nada,
E se me encontro por aí,
em uma esquina escura esquecida
aviso-me que volto a miúde
que isso de esquecer-se tem tempo determinado
que não se vai sem multa, sem caos
Digo-me que o fim é doído e que só se paga com saudade
Pode que me escape, me recupere, me entenda
Mas ó, vaga-lume, pode que convença.
Que vença, que doída volte,
Deixa esse vazio arder
Que o ardido pede água

E água traz de volta o que se afoga em seco.

5.5.11

-

Cruel não depender apenas de si para escrever. É certo, dependo de mim, mas dependo muito mais do espírito alheio.

*

Já se deu conta de que você pode ser apenas fonte de inspiração? E eu então te despejarei em folhas em branco e já não me servirás...

*

É quando meu coração se acalma que me vem o branco, o lapso de mim mesma.

*

Impossível desejar-te todos os dias. Há dias ensolarados e nublados, meu coração também sofre mudanças climáticas.

*

99% de mim se foi com você.

*

Não sou eu. É minha falta de paciência que te condena a ser passageiro.

10.2.11

Sou só eu que tenho vontade de chorar quando me vejo tão acesa dentro do meu lado mais escuro?

***
Se eu ainda fosse viva te daria o que há de melhor em mim. É que eu já venho me decompondo. Viva não sou, estou apenas...parte minha se foi aos poucos, aos pedaços se foi consumindo.
***

Não sei ao certo o ponto de partida, não sei quando será a chegada de algo tão meu que já deixou de ser propriedade e passou a ser órgão vital.
***

Um coração que apenas batia agora bombeia. Um sangue que corria agora irriga.
***

Meu coração não estava pronto. Juro que não estava! Não se pode chegar assim, sorrateiramente e ocupar o espaço inimigo. Eu não sei, eu não vi em que momento baixei a guarda, não me lembro quando foi o descuido, em que momento me abri para não mais fechar-me.
Tenho pena de mim. Ah, como me dá pena mudar de lugar. Serei eu agora quem mendiga? Serei eu agora quem chora? Minha razão acaba de dar-se conta do que meu coração bombardeava por meu corpo há dias. Eu não estava pronta. Eu não estou.
***

Me dá vontade, uma imensa vontade de despedir-me de ti antes mesmo de ver-te. É que me dói mais o poder que tens sobre mim do que tua ausência.
***

Já não sei mais se isso é ser livre.
***

Já não posso mais ser quem sou. Eu assim tão frágil ando quebrando meus costumes pelo caminho. Me vem a tua boca e me rouba o ar. Gente que não respira não é livre.
***

Só se sente de forma visceral aquilo que dói.
***

Ainda assim eu faria tudo novamente. Meu coração que antes sofria overdoses de capital, agora sofre por algo humano e com sentido.
Peço desculpas aos que confundi, sinto muito...confusão é tudo o que tenho.
***
Posso fazer-te feliz, mas prefiro fazer-te pensar.
***
Não há sorte que vença meus acasos.
***
Me dê uma chance. Eu a destruo.
***
Não sou feita de chances que a vida dá. Sou feita de chances que eu mesma crio.
***
Ilusão querer-me. Nem eu mesma me quero. Querer é poder, odeio o poder.
***
Meu coração não é túmulo, nada permanece ali eternamente.
***
Sugo o melhor de cada um depois os obrigo a partir e os ensino o que é liberdade.
***
Não dou inveja aos demais. Dou inveja ao destino que não soube bolar planos melhores.
***
Não se apaixone por mim. Nem eu mesma o faria, sou tão desprezível quanto o Palmeiras.
***
A juventude anda tão babaca que ando agradecendo aos meus primeiros sinais de expressão.
***
Eu iria até aonde a sorte me levasse, mas ela me abandonou por aqui...
***
O ser humano me inspira, eu expiro e lavo as mãos com alcool gel.
***
Quando me enterrarem, me agasalhem com folhas em branco.                                                                   ***
Em dias como hoje é que eu agradeço a todos os meus sabotadores.
***
Que a vida me perdoe por eu ser assim tão...eu.
***
Aprendi muito com pessoas incríveis, mas com as idiotas aprendi mais.
***
Não vejo pessoas insatisfeitas, vejo pessoas covardes.
***
Me deixe só, mas não me tire a caneta e o papel.
***
Não é uma questão de adaptar-se e sim de permitir-se ser.
***
Nada melhor do que ser apenas um transeunte embriagado.
***
Mudar de vida é somente realizar a vontade de levantar a bunda do sofá e ser o que não te permitem ser.
 ***
Todos os dias eu digo pro destino: PORRA, mano...faz alguma coisa!
 **
Já nas noites eu suplico mesmo.
 ***
Adoro quando a vida me dá chances de ser eu mesma.
 **
Adoro quando as noites fazem o mesmo.

14.12.10

2

-E se eu te amasse?
-Se me amasse eu saberia.
-Saberia como?
-Dizem que a gente sente isso.
-Isso o que? O amor do outro?
-É. Dizem que se sabe quando alguém ama a gente.
-Você me ama?
-Porque?
-Porque sinto que ama.
-Não, não sei se é amor.
-O que seria?
-Paixão, talvez.
-Dizem algo sobre sentir a paixão do outro?
-Nunca ouvi nada a respeito.
-Mas o que sente?
-Não sei. E você?
-Não sei também.

7.12.10

A permanência das coisas

Algumas gotas se fixaram na janela do banco traseiro. Elas moravam ali e distorciam as luzes lá de fora. Ficavam ali paradas provocando-me sobre a permanência das coisas. Ficariam ali até a morte, até secarem lentamente, evaporarem ou serem absorvidas por algo.
Eu não. Eu não permaneceria.
O táxi parou no próximo sinal vermelho. Olhei a esquina, o chão da esquina. Queria decorar cada centímetro paulistano, queria decorar mesmo o chão molhado, sujo, o bueiro aberto, o papel caído.
Queria decorar as folhas da pequena árvore em seu vaso branco. Queria decorar o asfalto, os buracos do asfalto, o sangue do asfalto.
Tentei decorar o trajeto todo, cada rua, cada esquina, cada bueiro e porta de bar. Tentei ignorar as luzes de natal, tentei ignorar o que não me pertencia.
A permanência das coisas. Nada permanece, algumas coisas apenas insistem, mas nada é capaz de permanecer. Mesmo as gotas partiriam, a diferença é que permaneceriam até sua morte, mas daí partiriam.
Eu partirei. Mais cedo que a minha morte, partirei até onde o desejo de mudança permitir. Não permaneço, não permanecerei.
Não permaneço porque meu humor é volúvel, minha forma é mutante e meu amor é instável. Nada em mim permanece, nada permanece em mim. Eu não posso, não devo, não sei permanecer.

És

Busco alguém que me busque. Busco alguém que me inspire e que expire Clarice, busco alguém que sopre e solte a fumaça que vive em mim, busco alguém que me ouça, me leia e me veja da mesma forma que decifra a si mesmo.
Busco alguém que seja nu, que se livre das máscaras, da mesma forma que eu desisti de me vestir de outro alguém.
Busco um ser livre, sem medo, com muito receio e cheio de expectativas sobre as zero expectativas que devemos ter. Busco alguém que me satisfaça com nada, que me preencha com coisas vagas, com histórias passadas com o nada que podemos ter.
Busco alguém que me cative pelo pouco, por pedaços poucos, por sentimentos loucos, por vazios que demonstram pouco, por delírios toscos, por vontades pequenas.
Busco alguém que seja assim tão eu, que se cative e desista de si na mesma noite, que me ame e me rejeite na mesma semana, que me invada e me desperdice no mesmo mês.
Busco alguém que se queira tanto, que se preze tanto que não possa se compartir. Busco um ser que não corrompa sua liberdade, que não delibere sua insanidade, que não perdoe minha insensatez.
Busco alguém difícil de preservar, fácil de consumir.
Busco um ser fácil de se apaixonar, difícil de possuir.
Busco um ser que eu não possua, deixando claro que jamais poderá possuir a mim. Busco a alma igual, gêmea, semelhante. Somos assim, meu caro.
Te amo e me amas. Nos amamos de longe, da forma mais pura.
Devora-me, mas não decifra-me e eu prometo ter-te inteiro mas jamais possuir-te todo.

29.11.10

Pessoas

Algumas pessoas são saudade. Ainda ali, ainda paradas em nossa frente, ainda ali residentes no instante, ainda assim são saudade.
Algumas pessoas são saudade, tem olhos de saudade mesmo que estes estejam diante dos seus, tem boca de saudade, rosto e corpo de saudade.
Algumas pessoas são alegria. Outras são futebol. Algumas pessoas são receio, outras medo e umas tantas são só necessidade.
Algumas pessoas são diversão, um chope no meio da tarde, um papo vago no começo da noite, algumas pessoas são diversão mesmo após sete chopes.
Algumas pessoas são só desejo. Só uma boca, um corpo, mãos e movimentos.
Algumas pessoas são amizade. São, sempre serão.
Algumas pessoas são saudade. Algumas pessoas são só saudade e carregam consigo esse maldito fardo, o peso de mesmo em tempo presente te mostrarem um futuro só com passado. O fardo de serem sempre saudade, de estarem sempre entre o sonho e o passado, um suspiro antes do futuro, um rombo no meio do presente.
Algumas pessoas são predestinadas a saudade. Algumas pessoas nascem apenas pra fazer a saudade nascer na gente.

19.11.10

Latindo

Voa voando, mostrando que sabe voar. Sem rumo e com asas, o que mais desejar?
                                      Voando alto, destino sul e norte. Voando baixo, planícies, planaltos, cordilheiras.
Forte, sólida América Latina. Nobre, colorida América Latina.
                                                                                             Orgulho e sangue. Luta, dor e glória de luta.
Voando valente se fazendo grande. Imensa América Latina.
                                                           Voa passarinho. Passará, passaremos.
Voa mesmo com a asa cortada. Voa mesmo com o falcão de olho.
                                                                                                               Voa e nos faz voar.

12.11.10

we are the bossa

É

Nada me persegue tanto quanto o quase. E eu quase me liberto, mas é apenas um quase, um quando eu tento, um ‘eu tento’ apenas.
O quase sempre esteve aqui, ali, lá escondido. Sempre sorrindo ou ouvindo atrás da porta.
Meu quase tem vontade própria, me arrasta, me dá rasteira, sai do bolo. Às vezes ele quase some, eu quase vivo, eu quase me vingo.
O que me incomoda é o maldito quase. Tudo é quase, sempre um quase. Meu quase é atrevido, sarcástico, petulante.
Às vezes ele quase me engana. Quase. Parece que às vezes ele quase se esquece de entrar em cena, quase. Mas é fingimento dele, é maldade, é derrota minha.
Tudo planejado, mais doído é o quase do último momento, do último segundo, quando o voo é mais alto, quando o tombo pode ser maior.
Meu quase é minha sina, meu marido, meu filho. O quase já não sabe viver sem mim e eu só sei viver com ele. Cruz nossa. Apego sem amor.
O que me incomoda é o bendito quase. Tudo é quase, sempre um quase. Nunca ‘É’.

9.11.10

O elevado

E o elevado continuava elevado para poucos. O chão inda era frio nos trinta graus, eles se deitavam, papelão com papelão compondo uma trama, uma rede, uma cama. Eles se ajeitavam e me olhavam com olhos de papel.
Eles me buscavam enquanto eu cruzava a rua, preto chão, chão preto, preto. Negro era o cordão, meu cordão, proteína, sangue, pulsação.
Cachaça não era festa, era sinônimo de pão. Busca alguém que preste, que valha mais que os desse chão. Cachaça não era festa, era mão.
E se eu desse, e se eu desse a minha mão? E se eu quisesse, e se eu quisesse tê-los como irmãos?
Cabeças recostadas sob o falso protesto em tinta, corpos embriagados sobre as cores do artista. E se ele desse, e se ele desse a sua mão?
Um lambe-lambe era apenas decoração. Cachaça era apenas pão. E se eu desse? E se eu desse a minha mão?
São só ossos, são só dentes, peles brilhantes em um papelão. E se eu desse, e se eu desse meu colchão?
E eles gritam, eles choram, eles levantam as mãos. Seus corpos bêbados mal respondem, seus peitos negros mal palpitam, seus ventres ocos mal digerem.
E que vergonha; teus sonhos vão na contramão.
Queria era dar-te um beijo, sentir a língua humana, o bicho que rejeitamos, o podre que retiramos. Queria tuas costelas, tão costelas! Ossos!
Que fizessem fila! Que conhecessem o humano. São vocês, são vocês!
Bichos envergonhados, bêbados, esfarrapados, humanos são vocês!
Somos apenas ratos, no calor do casulo ingrato, impostos pagos, silêncio barato.
Nós que merecemos o elevado, o lambe-lambe bizarro.
Queria era dar-te um beijo. Língua. Sugar um estômago, alimentar-me de um ar alcólico, cheirar-te a pele.
Costelas! Ah, costelas tão diferentes das minhas!
Deitar-me em teus peitos, acender um cigarro molhado e doado, um gole a mais, um gole a menos.
E vem o gozo: Tão humano. Tão humano! Tão humano!!! Aaaahh!!!

Tela...

Me desenhei como um desenho sozinho em tela branca. Uma vinte por vinte em tinta acrílica e com pouco expressionismo. Um simbolismo qualquer ou uma palavra-objeto como no concretismo.

Enfim, um desenho bem definido e deslocado do restante da tela, uma palavra concreta reticente ao restante do poema.
Desenhei-me como um ser que vai sozinho, tão forte e tão autêntico como o ser que se vira e pede um aplauso, descobri a falta de coerência e a busca por uma salva de palmas quente, tão quente quanto um abraço.
Percebi que escorregava em cores ao caminhar na tela, o vinte por vinte era pequeno e eu não era contemporânea o suficiente.
Percebi o excesso do amarelo, a falta do vermelho questionando nossos laços. Me vi entre o azul e o verde, um pouco conivente com o instantâneo.
Apaguei parte do corpo e desejei ser só retrato. Um sorriso de meia boca, pouco do decote me cabia no quadrado. Já me via na parede sobre a cabeceira ou diante da mesa de jantar.
Me percebi estática e pálida, me percebi esquálida e apática. Me vi como um rosto qualificado para a sala de estar.
Desejei ser ao menos poesia e me vi em duas cores, devorada por uma bêbada em teu sofá, me vi como notas em tua guitarra espanhola onde jamais poderia mostrar-te a graça da fenda em meu vestido, eu era só retrato quadrado e fechado até onde vai o decote.
Me notei entre teu soluço e teu tropeço embriagado, desejei estar ao teu lado,tentei adivinhar pouco de teus pensamentos, desejei ser tom, nota, melodia.
Já não cabia, já não podia, era ser estático, acabado e determinado em tua parede. Desejei a cegueira, o não ver era liberdade. Ver-te pintar outra tela me era castigo.
Desejei o abandono, item de leilão, obra mal acabada ou tela não desejada sob um pano branco.

Falso poema do amor ilimitado

E se definir é limitar,
Minha barca vai sem data de regresso
Minha ida é vontade de um corpo
Um corpo suado, exausto na cama
As vontades são compartidas
Desejos explícitos e mãos afoitas
Minha ida é sinal de progresso
É revolta perante os sinais,
Só agora me mostras o caminho?
Minha ida é sinal de protesto
O estável não me estabiliza
O instavel não me instiga
Vou sem remo nem nada
Abandono a barca
Abandono o amor
Se é amor, se é definido é limitado
Que se arrume o amor!
Que ele escolha uma barca qualquer
Que parta comigo
Sem remo, sem nada
Que vá além do hemisfério sul
Avante, amor!
Amor, avante!
Resgata-me entre o vinho tinto
Busca-me entre a falsa poesia
Se definir é limitar
Nada está definido
Nada está limitado.

ESSA PROSA TEM DONO.

E foi quando ele se afastou de mim que o céu se fez carbono.


Em branco estava a lua, vertendo o elixir que me faltava.

E tão longe estava!

Satélite que os sonhos traem, pura astrologia, carta de tarot!

Tão minha e sua, tão dentro de nosso céu. Hemisfério norte ou sul.

Entre a Paulista e Las Ramblas, entre minhas costas e tua barriga, tão minha e sua, tão nossa lua. Nossa lua, ausência de pressão no carbono, buraco em nosso desenho.

Nosso oco tão presente quanto os desenhos de seu contorno.

Nosso branco tão ausente quanto meu sono.

Tão presente quanto meu desejo, quanto nossos resquícios, nossa vontade, insanidade e culpa.

Tão lua, tão tua que deixa de ser minha. Tão dada, explícita, aguçada.

Presente como minha boca em fase crescente, como minha pele em posse de vênus, como minha guerra guiada por marte.

Minha lua, tão sem dono e tão tua.

Minha pele, tantos donos. Basta algum que me risque como um compasso, que me faça papel, que me faça uma página em branco. Basta algum que me tire os vestigíos animados de tua presença. Basta um que me faça poesia, que pare o relógio, que se faça borracha.

Minha lua guarda teus segredos, teus rabiscos, teus desenhos. Basta alguém que realce meu sol, que apague tua lua, teu riso, minha saudade.

Basta alguém que apague a rumba e sobreponha o chorinho.

Basta que esse alguém transforme Las ramblas em Lapa.

3.11.10

A criatura

E em um repente uma nova onda de melancolia me invade. É quando eu grito para meu lado surdo ouvir. É quando vejo minhas escolhas criando pele, pulmões e asas. É quando escuto a respiração afoita dos meus sonhos abafando o som do meu respirar.
E é nesse instante em que todas as janelas antes trancadas se abrem povoando meu mundo com um vento fresco, levantando as cortinas, varrendo as folhas velhas de árvores passadas.
E de repente recomeça a dolorosa vida: tudo o que me fez escolher já não existe mais. E a vida própria de minha escolha me assusta. Ela já respira, ela já caminha, ela já move as mãos e encaixota tudo que é meu. Posso ver suas veias verdes, seus olhos atentos, sua boca cheia de dentes, posso me enojar com seu sorriso sarcástico me avisando que é tarde.
Vejo minha criação e ela me assusta, ela me devora.


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26.9.10

Perdendo tempo.

Queria voltar ao tempo em que nada me perturbava. Nada me fascinava tanto, nada se lamentava muito.
Queria chegar num tempo em que eu não mude, onde nada mude, nada se altere.
Um tempo onde o caos ocorre lentamente, aos sopros, aos passos, aos pedaços. Quero não pensar. Pousar.
Quero os segundos mais lentos, menos sangrentos, menos doídos.
Quero não amar. Tudo o que é quente esfria, tudo que é novo estraga e tudo o que queima se consome.
Já não sou.
E naquela manhã chovia. Gota a gota num ritimo frenético. Algumas gotas pesadas batiam contra o vidro da janela e escorriam formando caminhos lentos de suicídio. Também fazia frio.
Difícil levantar-se em um dia desses. Me levantei e a dor de viver me invadiu pela milésima vez, a dor de existir e enfrentar um mundo vazio me fazia viver menos.
Coloquei o velho roupão azul, há meses havia decidido comprar um novo mas ainda nada.
Um café com vista para o nada. Bebi olhando a janela, os carros passavam apressados fazendo um barulho cortante, as pessoas andavam debaixo de seus guarda chuvas trombando umas nas outras, os cães não passeavam.
O relógio ia convencendo as pessoas de que já era dia. Mais um.
Acendi um cigarro como forma de me atrasar mais um bocado, como se prolongasse o pouco tempo que ainda tinha dentro de meu casulo. Fiquei parada na janela, apoiei um dos joelhos na poltrona amarela e fiz de conta que nenhum compromisso me esperava. Fiquei assim por uma hora.
Respirei fundo e andei até a escrivaninha do canto da sala, peguei o telefone e liguei para o escritório. "Não vou hoje, ando doente".
Ando doente, muito doente. O mundo todo anda.
Fui até a cozinha e pela primeira vez notei como ela era clara, o piso todo branco se unia com as paredes feitas com um azulejo estranhamente parecido com o do chão. Nunca notara tamanha semelhança, tamanha falta de graça. Ao fundo o fogão e a pia com sempre meia dúzia de copos a serem lavados e uns tantos no escorredor. Tenho compulsão por bebida. Qualquer líquido. Ingerir apenas.
A lavanderia logo ao lado não escondia segredo algum, apenas uma bagunça desavergonhada.
Clara e sem graça, ali mesmo peguei um novo copo e o enchi de água e gelo, me encanta o gelo, sua forma tranquila de boiar na mesma água em que vai morrer. Me fascina seu estalar e sua lenta despedida.
Sentia-me estranha, mais estranha que o estranha de sempre, uma tontura e uma pressão nos ouvidos me deixavam surda por alguns momentos, sentia o corpo pesado, gordo, grande. As mãos tremiam como sempre e a boca secava mais a cada gole.
Sentia também um peso enorme entre as sobrancelhas, um peso bem no terceiro olho e a surdez aumentava o volume dos meus pensamentos.
Pensar me incomoda porque me rouba deste mundo.
Como todo ser que se sabota tentei curar meu mal com um novo cigarro, sentei na poltrona azul e fiquei olhando a fumaça pairar sobre o centro da sala.
Ainda me sentia mal, estranha, densa, me levantei buscar mais água e nesse mesmo instante caí. E o cair me revoltou, me senti besta, sonsa, me senti invadida e contrariada.
O peso do meio das sobrancelhas deu lugar à dor, senti a testa quente e úmida, senti cheiro de sangue. Doía.
E a dor alimenta.
Me sentei no braço da poltrona tampando com a mão o corte. Tive um súbito ataque de riso.
A maçaneta da porta girou, a faxineira invadia meu mundo.
"O que aconteceu com a senhora?"
"Nada não."
"Mas está sangrando!"
"Um tombo apenas, ando estabanada".
"Vai ter que dar ponto, deixa eu ver."
Ela olhava para meu rosto como se olhasse para uma lesma esmagada, aquela expressão indecifrável me fez levantar depressa.
"Vou lavar."
"A senhora não quer ajuda?"
"Não."

20.7.10

Para os que não entendem, deixo mil respostas abertas e infinitas entrelinhas. Para os que acham que entendem, deixo um leve cinismo, um sorriso de canto de boca.

10.7.10

...

São muitas as opções de caminho e isso me paralisa. São muitas as opções de destino, muitas são as portas que se abriram e eu já não sei mais por qual quero entrar.
Também são muitas as saudades que ainda cicatrizam aqui dentro.
Eu, que tanto me busquei, já não sei quem sou. Eu me revirei tanto, me revoltei, me pus do avesso e do avesso e já não sei mais em qual parte de mim mesma me encontro agora.
Descobri que sou mais mutante que pensava. Quando me canso corto os cabelos, me canso e largo o emprego, me canso e mudo o romance, me canso e troco o país.
E é isso que me faz temer a liberdade. Como se ela não me permitisse um pouso, como se não me desse tempo, como se me tornasse nômade. Pior, ela faz meu coração ser nômade, ela impede que qualquer ser se aposse dele. Enquanto tudo o que eu queria era que alguém o sequestrasse.
As vezes me dá um medo do ontem. Perigoso isso de não ter medo do amanhã. Perigosa essa coisa de deixar-se, permitir-se ser. É como se todo o meu tempo fosse vivido apenas para mim. Já não sei mais compartir o meu eu. Não sei mais o que fazer com toda essa profundidade inútil que descobri.
É inútil.
Conhecer-se apenas nos torna mais egoístas, bobagem tudo isso de auto-conhecimento. Tanto me descobri, que virei um livro de auto-ajuda ambulante. Troquei a literatura por ensaios auto-biográficos.
Pior, construí uma solidão que não existia. Me descobri incompativel com a humanidade, me construí à margem disso tudo e agora já é impossível voltar ao núcleo.

3.3.10

Minha vida virou esperar.

Minha vida virou esperar,
E meu coração virou relógio.
Tempo, o tempo que faz tudo mudar,
Desbanca meus sonhos e planos astrológicos.
Minha vida é a espera que não cessa,
A semente que nunca brota,
A corda bamba fina e frágil.
Uma angustiante insônia permanente,
Uma aventura insossa interminável,
Uma farmácia antidepressiva.
Uma vida toda dedicada á palavras,
Palavras nunca lidas, nunca ousadas.
Minha vida virou a espera da saudade,
A eternidade embalada por uma lenta canção.
Uma espera de passos curtos, abandonados.
Uma vida á beira da insanidade,
Repleta de idéias que nunca vingam,
De sons que nunca tocam.
Minha vida virou esperar.
E essa espera de tantos anos é única
E a única companhia de noites aflitas,
A única verdade de dias longos e opacos.
Minha vida tem sabor de livros,
Tem sabor de músicas de outra geração.
Minha vida de espera é um ensaio
Que espera os três sinais para a atuação
Minha vida de manias e mistério,
Tantos dons gritantes sem visão,
Sem vazão, sem razão.
Tanto amor que brota e arde,
Como tanta água que sufoca a planta,
E o verde da esperança não me pertence,
Sendo negra a cor de uma espera,
A espera de quem nunca alcança.

2.3.10

VIM

Vim pra sabotar o teu sorriso
Confuso amigo, Confúcio
Vim pra despejar veneno, suar tua pele
Calafrio querido, calar o frio
Vim pra te marcar a vida, corrompida por mim
Corromper-se, perder-se no rombo da vida
Vim pra embriagar tua rotina, à risca
Riscado de mim
Vim pra entorpecer e depois partir
Vim pra dar sabor e deixar mais vontade
Vim pra sair, à francesa ou não!
Sair sim, não vim para entrar.
.
Hoje morri um bocado
Perdi um pedaço, uma metade
Hoje escrevi mal, e além disso mal escrevi
Perdi um pedaço, uma metade de mim

Hoje chorei sentindo que algo apagou
Hoje pensei em voltar, em tentar
Mas faltou-me forças, perdi a vontade
E além da vontade, as vontades de ti

Hoje amarguei um bocado
Me senti mais banal, fugaz
Hoje escrevi mal e também mal de ti

Hoje faltou-me algo
Faltou-me inspiração, paixão
Hoje chorei vendo a dor do meu peito partir

Viva a roça...

Viva a roça
Viva Palhoça
Viva o velho barbado,
Sentado
Viva a roça
Carroça
Viva a terra, o feijão e o mato
Sente o café passando
Olha a vaca pastando
Viva a gente sofrida,
Sentida
Olha a mosca, o bolo e o gado
Olha o velho sentado,
Cansado
Veja a vida que nasce e morre na mesa
Viva a roça
João, Francisco e Tereza
Vê também o cinza chegando
Zombando de um povo danado
Zombando do velho sentado,
Cansado, barbado
Zomba da vida na roça
Quem nunca pisou a terra
Nunca deitou-se na poça
Nunca lutou a guerra
De chuva ele não sabe nada
Nem do sabor do bolinho,
Nem da dor da gota pesada
O cinza zombando,
Não sabe abrasileirar o encanto
Não sabe da lida,
Da vida simples, batida
Do velho caipira cansado,
Barbado, sentado.

21.2.10

Soneto da desordem

Foi na desordem do meu coração
Nos dez minutos de solidão
Foi na tristeza de ficar sem chão
Na angústia da desilusão

Foi na angústia do meu coração
Na tristeza da solidão
Nos dez minutos em que fiquei sem chão
Foi na desordem da desilusão

Foi na tristeza do meu coração
Na desordem que me deixou sem chão
Nos dez minutos de desilusão

Foi na angústia da solidão
Em que a tristeza da desilusão
Nos desordenou e nos tirou o chão

11.2.10

Sinto um leve desespero
Uma sensação que nem te conto
Sinto que algo parte ao meio
E não fica bem assim tão roto
Sinto algo de desencanto
E uma mistura de saudade
Como se ninguém ouvisse o pranto
De te perder bem na metade
Sinto falta da esperança
Que antes me marcava
Sinto sede de vingança
De uma lua que enganava
Sinto vontade de regresso
E uma entrega desvairada
Sinto falta de um progresso
Para uma história encravada
Sinto um leve desespero
Uma sensação que nem te conto
Sinto que algo parte ao meio
E não fica bem assim tão roto

10.2.10

Quem me dera encontrar-te nas esquinas amargas da minha vida. Quem sabe eu não resgataria assim o sonho de dormir em sorrisos e sonhar com nuvens!
Sinto que já não vale muito o que sinto, sinto que o medo virou distância, a distância virou saudade, a saudade acabou em desespero.
Volto às entranhas que nunca me abandonaram, resgato assim a frieza que perdi, a leveza que destruí, os sonhos que se misturaram.
Finjo que é passado, finjo que não dói achando que assim dói menos.
Engulo meu caos e desespero, me espalho pelas ruas, me reviro do começo. Do começo ao fim pulando o meio. Sinto que não tivemos meio. Sinto.
Ainda sinto teu gosto, teu desgosto e busco nas lembranças da pele o teu sorriso. Ainda busco compor teu rosto e espero jamais esquecer de um detalhe. Já não ouço música o bastante. Ouço o suficiente para me manter sã. As músicas me levam a mim, me levam a ti, me soam saudade.
Já não espero, já não reclamo, já não proclamo, já não prometo. Livre não estou, não sou. Mas sempre em cada milímetro meu haverá algo teu, em cada desejo, em cada silêncio, em cada sumiço, sim, em cada movimento. E cada música que, a contragosto eu ouvir, dedicarei a ti.

9.2.10

Sinto que não escrevo, vazo. Sinto a vazão das coisas, sinto a liberdade batendo à porta ao mesmo instante em que a saudade me tomba.
Já não sou aquele mesmo rio, já não chamo aquele mesmo nome e já não ouço aquele mesmo som. Sinto a profundidade dos fatos me levando de bar em bar, de mesa em mesa, de chão a chão.

8.2.10

?

Alem do limite do que não fui, com o que acabo de ser, acabo me tornando algo assim nulo, neutro, raso, subdesenvolvido.
Algo simples sem ar metódico, sem ar naturalista, sem afago brando de lua cheia e onda cristalina.
Acabo me tornado o que ontem não seria, acabo me tornando o que em breve detestaria, acabo me tornando o esquecimento do que apenas preciso esquecer para me lembrar quem sou.
Sou frágil demais para reconhecer-me em meus sonhos e martírios, sou fêmea demais para seguir meus discursos de boêmio em mesa de bar.
Acabo me tornando aquilo mesmo, aquilo que eu mesma não queria, aquilo que eu mesma repudio, aquilo que não faz sentido para o que eu pretendia ser e fazer.
Acabo lembrando de tudo como um delírio, como um resquício de lembrança primaveril, como símbolo de um destino teimoso e ácido.
E agora sou o que sempre critiquei, sou frágil, fêmea, nula e neutra, sou só a rosa que teima abrir em noite de lua cheia. Além do meu limite, além do teu limite, além de nós dois, já fui e hoje não sou.

E o que se faz de peito vazio?

E o que a gente faz com o peito vazio? Me conta o que move a gente quando o que se sente não passa de tédio e calafrio? Quem me dera voltar ao sofrer de um amor que matava aos poucos de forma lenta, de forma vil e tempestuosa, de forma quente, ardida, ardente.
O que a gente faz com uma noite fria quando o coração da gente não pula, não treme, não despedaça? O que se faz com uma pele que não arrepia, com pernas que não tremem, não faltam?
O que se escreve de peito vazio? O que se escreve?
Ensina-me a viver no sertão, sem água, sem sal da pele, sem sal da terra, sem um bem querer que a gente queira.
Finda então toda a minha vontade de paixão e nasce uma nova overdose de álcool e uma constante busca por uma nova inspiração urgente. Finda toda a minha vontade de queimar. Como se convive sem o sentimento de tristeza que atropela a gente que nem caminhão no meio do sertão da razão que agora sobra?
É fato que sei viver de peito cheio e colo vazio, é fato que sei amar por dois, é fato! É fácil!
Difícil é o oposto, é acordar de peito vazio, é beber pra celebrar, é se enfeitar só pra se vingar, é escrever só pra não lembrar.
O que me dói, me mata, o que me apaga aos poucos, de forma triste sem beleza, de forma circense e nada poética é encontrar-me de peito aberto.
Esses momentos de espera por um novo dono deixam meu coração bobo, pequeno e desassossegado.
A calmaria me incomoda.
Eu quero é medo, eu quero é frio na barriga, quero a fadiga embebida de suor e lágrimas. Eu quero bossa nova com jazz no meio da madrugada, quero vinho tinto e cerveja em plena quarta-feira, quero a loucura camuflada de depressão no meio da solidão paulistana.

31.1.10

Edifício Adaga

Revirando as lembranças,
Deparei-me com o Edifício Adaga
Calculei o tempo que perdi
Fiz as contas das chances que me restam
Os bons tempos não voltam mais
A saudade foi o caminho que escolhi,
Entrei pela porta errada
E nada mais pode trazer de volta,
O meu moço do Edifício Adaga

7.1.10

Rumba Catalana

Hei de deitar em teu peito e sentir teu abraço
Mudando os caminhos, chorando os pedaços da vida
Hei de sentir a areia por entre os dedos dos pés,
Caminhar descalça ao teu lado, molhar-me em água salgada
Hei de juntar nossas migalhas, somar nossas palavras
Teus versos nos meus, minhas rimas em tua poesia
Hei de passar horas avoadas em uma mesa de bar,
As mãos abobadas e displicentes a descolar um rótulo qualquer
Hei de passar madrugadas insones, hei de compor uma fantasia.
Hei de soprar a fumaça azul no vento frio
E aquecer teu corpo com uma loucura só minha.
Hei de acordar de um sonho qualquer,
E assim viver anos em poucos dias.
Acabar-me em uma overdose literária
Ao som da rumba catalana
Aos respingos do mediterrâneo

Imagem: Estudo de tela - Tablao flamenco, de Fabian Pérez

Mora em meu peito...

Mora em meu peito a saudade, 'el cielo' que, soprado ao meu ouvido, me parte ao meio, me rouba o ar.
Mora em meu peito a verdade, o segredo, a confissão às paredes.
Mora em meu peito a lembrança, o vestígio do que fui ontem, o passado recente que jamais me invadiu tanto quanto o tango.
Mora meu menino, meu domínio, nossa fronteira.
Arde em meu peito teu sotaque, moram as noites madrileñas e andaluces a beira-mar.

Imagem: Tela - Tango, Fabián Perez

2.12.09

SP...

Ai cidade que nunca fecha, nunca espera, nunca dorme e nem ao menos repousa. Diz-me quantas cabeças por aí passam, quantas mentes latejantes por aí vagam, quantas memórias te percorrem, quantas histórias por aqui brotam e que por tuas ruas morrem.
Quantas cabeças passam o dia pensando, buscando, achando respostas para o dia de amanhã. Quantos carros por tuas artérias, quantas rodas por tuas ruas passam, correm fazendo um ruído que vai morrendo distante e tornando-se frio.
Quantos sapatos humilham tuas calçadas, quantas marcas, quantos pés descalços. Quantos pés, quantos passos, quantas pernas vadias empacam em tuas esquinas, quantas meninas, quantas mulheres.
Quanta saudade repousa em seus travesseiros, quantas lágrimas caem de saudade, quantos amores mal-amados, quantas mães vazias de respostas, quantos falidos tentam embarcar em seus refúgios de plumas e algodão.
Quantas crianças se assustam de medo, quanto terror, quantos monstros de armário. Quantas crianças se assustam de medo, quanto terror, quanta fome em um pequeno estômago.
Quantos corpos suados, mal-cuidados, pesados, torneados, tatuados compõem tua novela díária.
Cidade, me conta quantas mulheres perfumam teu ar, adoçam tuas ruas, enfeitam-se de vulgaridade, diz-me quantas?
Quantas luzes iluminam tuas ruas, quantas cores, quantos postes enfileiram-se em tuas calçadas, quantos faróis cortejam teu asfalto, quantas janelas te exibem os insones.
Quanta arte se faz em teus muros, quanta revolta se escreve em teus viadutos, quantos artistas desperdiçados encontram-se em tuas esquinas. Quantos políticos, quantos revolucionários se perdem em tua rotina.
Quantos vícios se fazem em tuas noites, quanta coisa se cheira, se injeta, se fuma. Quanta grana te injetam, te cheiram, te sugam.
Quanta grana se gasta, se usa, se ostenta em teus bairros distintos. Quantas grifes, quantos bancos, quantas festas e champagne.
Quantos bueiros, quantas enchentes, quantos sonhos infantis se perdem em teus ralos, quantas cabeças embriagadas giram em seus papelões, em tuas calçadas esburacadas.
Quanta comida te falta, quanta comida se joga. Quanta luta compõe a tua história, quanta luta se ignora.
Quanta bebida é exibida, quantos graçons se aprimoram em simpatia, quantas taças são servidas. Quantas garrafas acompanham os mendigos, os morimbundos que se encostam pelas paredes, que se deitam e se aquecem com seus cães.
Quantas histórias se desenrolam em teus apartamentos, quantos solitários se mascaram, quantos comprimidos se engolem em uma noite sem amor, sem sabor.
Quantos de teus paulistanos se epertam em teus ônibus, quantos madrugam, quantos suam por um aluguel. Quantos morrem em teus leitos, em tuas ruas, em teu caos.
Quantos absorvem teu luxo, teu conteúdo, teu refinado mundo em vitrine cosmopolita, teu frágil sistema esnobe de uma fake turma grã-fina.
Quantos movimentam teus cofres, quantos movimentam teus abrigos.
Quanta música se faz, quantos artistas, quanta melodia se compõe em um único dia. Quantos boemios se revelam em teus bares e luzes de neon.
Quanta obra-prima. Quanta natureza morta.
Quanta rotina. Quanta vida vazia regada de calor humano.
Quanta valentia se faz necessária para viver em tuas veias. Quanta ousadia se faz necessária para vencer em tuas veias.
Quanta malícia se faz necessária para desenhar tuas ingênuas histórias. Quanta luxúria, quanta vaidade, quantas camas abraçam corpos suados e desejosos de orgasmos e despedidas.
Ai cidade, por essa noite peço que durma, que repouse, que pare. Por minutos em que o meu silêncio se faz corajoso, em que teu silêncio se faz necessário.

20.9.09

Que meu samba não se torne tango...

Que meu samba não se torne tango
Que meu sorriso não se molhe em pranto
Que o meu corpo não se reparta mais
Que eu não viva esse desatino, esse desalento
Que eu não me submeta ao sorriso de um novo menino
Que meu samba não se torne tango
Tarde
Foi como um respirar
Uma tragada a menos em algo velho
Um suspiro novo
Um esfumaçar
E é o mesmo velho sentido das coisas
A mesma sensação para um novo calafrio
O velho arrepio de sempre,
Sensível à uma nova brisa no ouvido;
Sotaque. Tango.
Do samba, pelo samba
Pelo samba foi sempre a mesma canção
Pelo samba-canção sempre a mesma rima
Quase a minha rotina
“Desde que o samba é samba é assim”
Para os subúrbios cariocas
E à Barra-funda sob garoa
Deixo as minhas saudades
E as minhas desculpas;
Perdão pandeiros e baquetas
Perdão roda e quadra, malandros e mulatas,
Batucada e embolada,
Perdão por render-me tão irreversivelmente ao tango.

13.1.09

Ainda...

Inda lembro de ver meus olhos dentro dos teus
Inda sinto a brisa, o abraço, a vila
Sinto a falta do balanço, do violão
Do samba, do choro-canção
Ainda vejo teu sorriso
Tua fraqueza, tua incerteza, teu fascínio
Ainda sinto meu menino, ainda espero
Ainda és e há de ser por muito tempo
Minha razão, minha poesia, minha magia
Ainda hei de ser palco
Hei de ser samba
Hei de ser canção
Ainda somos eternos
E se é eterno, ainda seremos então
Nem que seja em rima, em melodia à beira-mar
Nem que seja em bossa-nova
Ou em forma de prosa
Ainda em brasa, ainda arde
Ainda em arte, ainda em esperar.
A boca quente, sente, brota
A terra espera a volta, a porta aberta
O rio desce até o frio do umbigo
Em busca do que anda quente e perdido
A flor da gente anda murcha, anda ardente
À flor da pele, como sempre, como ausente
No precipício das destemperadas partidas
Na boca seca, na pele quente, na ferida
No caos que me transborda e me fascina
Na lembrança esfumaçada, na neblina
Fica a saudade no fundo da taça
Fica a boca quente na borda, no gole
Fica o caco de vidro, a partida
A partilha do que não foi definido
A boca fria, a ausência e a ferida.

26.11.08

Suspensa


Ainda que recolhido, contido, ainda que naufragado, estragado, ainda assim hei de contar os dias e as tardes quentes que me separam do que mais amo.
Fica aqui trancada no peito a vontade que parte-me a carne, a saudade que parte-me a calma, a tristeza que parte-me a alma.
Fica frágil e desistida a intenção de tocar-te de alguma forma, fica contido o impulso que me movia, me levava, me fazia viva.
Fica claro que não é mais dia, fica nítida a fraqueza das palavras e a falta de beleza de meu texto. Fica óbvia a falta de inspiração, fica fria.
Fica a ilusão, a busca por novidade, paixão ou alguma razão que me motive, que me fascine ou entristeça, fica a saudade das palavras que não me andam servindo.

8.10.08

fim
.
.
.

Fim
Finda aqui, limite
Encerra, acaba, termina
Fim
Finda aqui, bem além do meu limite
Já na divisa do que não fui
Com o que acabo de ser
Termina, fracassa, finda
Fim de esperas, fim de luas intermináveis
Fim de promessas louváveis
Fim de delírio afáveis
Finda aqui
Vai e rouba o recheio
O contexto, a sensação do peito cheio
Fim, fim das cheias
Aberto e vazio
Opaco e livre
Peito livre, pranto seco
Fim das cheias
Das lágrimas sorrateiras
Das palavras arteiras
Finda aqui, bem além do meu limite
Na divisa, na fronteira com a razão
Fim de tudo o que insiste
Tudo que existe
Que não mais persiste
Fim
Livre fim
Na divisa com meu sertão...


... De volta ao tempo das secas
E as uvas nem foram colhidas
E a falta que você faz e inda há de fazer
E as noites são sempre mal dormidas
Hedonismo, forma de se perder
E as provas nem foram exibidas
E inda há de se escrever
Há que se escrever
Há que sobreviver
Há que entardecer
E as uvas nem foram colhidas...

28.9.08

Amor Envelhecido Não Presta.

Não consigo escrever porque te amo. O amor envelhecido estraga. A inspiração já não conta, já não sobra, já não vinga nem vira canção.

Amor envelhecido é dose. É pranto, buraco laranja, saudade cinza.

Já não saem mais versos, apenas verbos sem razão.

Amor envelhecido não me basta, não preenche, não se gasta. Inda amo, mas amor estagnado não presta.
Ela voltou porque era cedo
Ele voltou porque era tarde
Ela suspirou ao padre santo
Ele pecou com a santa madre
Dos loucos e santos passos, subiu aos céus dos delírios, guardou os verbos, comeu segredos, subiu às ondas em formação.

De loucos impérios e massacres, voltou com medo no sobrenome, guardou os mantos, beijou os santos, soltou segredos.

Para os loucos mortais transeuntes ofereceu massacres, vestindo império explorou segredos, escondeu os verbos, corrompeu os mantos santos.

De volta às ondas loucas, chorou segredos, implorou aos santos, respirou delírio. Caiu do império, verteu massacres, soltou os verbos, perdeu o passo e os mantos.

26.9.08

A transformação de um personagem. Sobreviver! Quem não se transforma para sobreviver? Quem não é estátua viva e impotente?

22.9.08

Una Mescla


Conheço la puerta que se abre
Da mesma forma que conozco quem a fecha
Conheço as fechaduras y las llaves
Conheço nuvens e tempestades
Conheço países e ciudades
Conheço a porta que se abre
Da mesma forma que conheço a ventanilla
Conheço as rumbas y las tardes
Conheço os chupitos e os mares
Conheço os distintos y los iguales
Conheço las mentiras e as verdades
Conozco la puerta que se abre
De la misma manera que conozco quien la cierra
Conozco la playa e a serra
Conozco a fruta y la tierra
Conozco la lucha y la guerra
Conheço a culpa de quem erra

15.9.08

Embriaga-me desta forma mesmo, só soltando a rima, só soltando a brisa de um suspiro. Vem e devora-me daquela forma mesmo, aos poucos, aos pedaços, em doses homeopáticas.
Alucina-me desse jeito mesmo, tão menino, tão faceiro, tão certeiro.
Encanta-me e canta, canta teu verso, o meu verso, tanto faz.
E mesmo depois, assim já partindo, já partido, cega-me pra que nenhum outro possa ocupar meu peito, meu leito, meu palco.
Continua enfeitiçando meus dias, meus sonetos, contos e música. Feitiço. Foi feitiço da lua, a lua que agora mingua e nem sei se vai crescer, nem sei se vou contemplá-la cheia.
Foi feitiço. O melhor feitiço. Junino.
A distância que existe, só faz ser mais triste e quanto mais triste mais há o amor, a saudade que existe, só faz ser mais urgente e quanto mais urgente mais explícito o amor.
Ainda dá tempo, ainda há tempo, tempo. Vem somar-se á lua, vem gritar da rua, vem fazer-me tua.
Vem com dor de saudade, vem com novidade.
Vem que me cansa escrever o passado, vem que me cansa desenhar o futuro.
Lua cheia, novo ciclo, ciclo cheio, destino. Desatino, desalento, toca o sino, bate o vento. Lua cheia, novo vício, sem destino, toca o vento. Bate o sino, velho ciclo, lua cheia, novo vento.
Então faça chover, faça molhar
Quem dera beber, me afogar!
Então faça logo, faça algo
Quem espera a boca secar?
Então venha sempre, venha breve
Quem vai, tende sempre a voltar
Poco pan, maximo circo

El mundo esta en tus manos
.
Pouco a pouco
Do suspiro ao sussurro
Do arrepio ao frio
Do frio ao calafrio
Do calafrio ao vazio
Porque tudo tem um fim
O tempo já tratou de esfriar e tudo o que é frio se esquece num dia quente de verão.
Volátil

Fica aqui um descompasso meu
Uma lacuna enfeitiçada que já não quer mais existir
Fica aqui a ausência cativada pela saudade
A eterna saudade que me rendeu
Acabo de acordar de um sono profundo
Acabo de chegar ao fundo do meu amor
O tempo foi escorrendo e deslizando
Foi transformando os sentidos já sentidos
Foi corrompendo a paixão, murchando a flor
Fica aqui um descompasso meu
A lacuna das minhas vontades insanas
O pranto, o desejo, o balanço, o canto
Fica aqui todo meu calor
Tudo que ardeu, tudo que expirou
Fica aqui meu vapor, águas passadas
Deixo apenas as marcas, as farpas
Deixo meus rabiscos, minhas rimas
Fica aqui um descompasso meu
Deixo minhas lembranças todas para ti
Minha última gota acaba de evaporar-se
Meu único amor acaba de partir
Buraco

Um buraco imenso
Se abre, me chama, inflama
Uma saudade de encontrar-me
Uma vontade de deixar-me
Como se eu consumisse apenas medo
Como se eu fosse um relógio enfermo
Um apocalipse ambulante
Uma bula inconstante
Um buraco sem remédio
Uma dor sem analgésico
Sou um ser condenado
Ao fracasso e a ilusão
Sou um nada sem platéia
Um alucinógeno sem ingestão
Sinto que se não escrevo, vazo
Uma náufraga na imensidão do mar
Um buraco me inflama, me chama
Sou saudade sem reencontro
Ponto final em questão aberta
Sou a tristeza que perambula,
Nas noites de bossa nova
Sou a madrugada aberta ás overdoses
Transtornos obsessivos e neuroses
Sou a modernidade personificada
Sou o apego à poesia e ao nada
Sou a melancolia, um buraco, um caco
O ponto final de uma via crucis
Que consome o buraco, que consome a mim.
Mentira

Mentira.
Mentira que você veio ou foi
Mentira que sabe de identidade,
Que identifica o idêntico.
Mentira que coleciona verdades
Sonhos de algodão, países e cidades
Mentira que cativa, que é feliz
Mentira!
Há uma verdade estranha
Uma dor bem em nosso nariz
Mentira que não repara, que não vê
Mentira que não sabe da chuva no estômago
Que não sente o sangue mais grosso
Que não repara quando o peito parte ao meio
De frio e arrepio
Mentira que não sente o pulo no meio dos pulmões.
Que não vê o mundo parar
Mentira que sorri de doze em doze
Que não se guarda, não se analisa
Mentira que ama, que luta
Solidário, solitário castiçal
Mentira!
Mentira que faz de mim uma mentira
Mentira seca, mal fabricada
Sem drama, sem gosto, sem pele, sem nada!
Carretel de Palavras
Frio. Vil, sinto medo do vazio, um fio que separa a famosa linha tênue que me ampara tamanha a certeza da pequena distância. Estância climática, feito você em mim, no fim, dentro do meio do vazio frio, um passo antes de cruzar a tal linha. Tinha, já não se possui esperança alguma de história nenhuma. Uma vez que fomos algo tão longe de ser algo assim de fato descritivo e palpável. Afável sim, sem dúvida ferina que estraçalha qualquer sensação de razão, que perturba o sono de quem deveria dormir. Fingir, fingir virou resposta prum sorriso aqui, um suspiro lá. Dá pra viver assim lentamente esperando o sentido frio de um vazio latente, presente de uma forma contraditória de qualquer oratória em forma de oração. Vazão de princípios líquidos, batidos em liquidificador, os sólidos já não me importam devido a sua falta de adaptação ao corpo. Torno a necessitar que alguém, alguém me salve e corte ao meio o maldito fio. Adio o momento de dizer-te adeus. Deus! Alguém me salve da fé que me traz a falsa esperança. Criança que pode de forma sorrateira cortar o maldito fio. Fio, a tal da famosa linha tênue que separa o meu do teu ponto de vista. Invista criança! Lembrança que tenho de uma forma fatal de sentidos feridos por um feitiço junino. Menino, peça a alguém, alguém corte a maldita linha tênue que separa a distância, a estância climática e emblemática que envolve teu corpo no meu. Eu no teu eu. Teu. Meu

31.8.08

Guaiá

Quero uma única vez a beleza de tuas palavras em meu ouvido. Quero a tua imagem parada ao pé da cama prestes a resgatar algo em mim já perdido.

Quero o som, todo o som possível, toda a acústica sensível, um sopro de voz.

Quero uma chuva em meu estômago, um pulo entre os pulmões, reverberar meu âmago, cintilar.

Sacudir o caos que transborda, manifestar as rimas latentes e presentes, naufragar.

Quero ao menos uma única vez, mesmo sabendo que o sol poente pode determinar o fim, arder os versos e os verbos nunca ditos.

Quero poder fechar a porta com uma saudade recente e sufocante, quero descompassar.

Findar a distância e a ânsia lírica, quase platônica.

Quero confundir o ciclo, nascer ao sol, antes borboleta e depois encasular.

Quero consumir o que resta, pousar e fechar as asas, unir as partes que se abrem ao voar.

Quero a destreza de tuas palavras em meu ouvido, quero os sentidos acesos, receptivos. Quero o planalto mais perto, mais certo, menos deserto.

Quero o som, todo o som possível, toda a acústica sensível, um sopro de voz.

16.8.08

Pra onde foi,
Pra onde vai,
Importa que somente tenha sido?
Importa que tenham feito?
Tentado? Caído?
E agora, pra onde vai?
Onde dará?
Pra que se lutar?
Lutar?
Lutar!
De que forma?
Por quais formas?
Que tipo de rebeldia?
Manifestantes de interesses
Interesses pessoais
Aparecer, cool, all stars
Pra onde ir agora
Impacto?
Qual impacto causar
Que impacto causar
Causar?
Qual tipo de causar?
Assistir, ver passar
Vai passar.
De transitar ou terminar?
Pra onde foi?
A quem se unir,
Uniões são separatistas?
Vou ficar, vou ver, vou esperar
Vai passar?
Vou lutar!
Vou formar, vou causar
Vou rabiscar o meu all star!
e BossaNova

Ando com saudades de mim
Ando com as pernas um tanto bambas
Ando confusa e quase curada
Ando com medo da tarja-preta
Ando me perdendo em química
E bossanova
Ando com saudades de ti
Ando com as mãos calejadas
Ando doente e um tanto cansada
Ando com medo de mesa branca
Ando me encontrando em roubadas
E bossanova

16.6.08

Parte-me

Parte-me a alma e devolve-me a carne

Deixa-me o resto e leva as lembranças

Ama-me a ponto de um corpo inteiro

Chama-me baixo prum anjo guardar



Canta meus versos ao pé da cama

E cobre meus olhos com o sol da manhã

Morde-me a pele e arrepia-me o pelo

Volta chorando, porque chorar é cantar



Beija-me os seios e invade-me a calma

Lambe-me a nuca e me conta um segredo

Rouba-me o corpo e parte-me ao meio



Canta teus versos beijando-me os olhos

Morde-me os lábios e entorna veneno

Parte-me ao meio e rouba-me o corpo

2.6.08

Samba novo


Vou arrumar a casa
Limpar cada canto teu
Vou consertar as asas
Vasculhar cada canto meu

Resolvi por uma pedra no caminho
Resolvi contar os cacos bem baixinho
Resolvi dar uma chance pro vizinho
Resolvi que minha flor
[não vai ter espinho

Vou arrumar a sala
Defumar os quatro cantos do meu ser
Vou desmanchar a mala
Jogar tarô e ver as chances que vou ter

Namorando cada anjo, cada peça, cada flor
Enluarando a madrugada, sou da noite poesia
Cantando cada verso, na batida do amor
Levanto a saia pra sambar junto aos respingos do mar

Resolvi por uma pedra no caminho
Resolvi contar os cacos bem baixinho
Resolvi dar uma chance pro vizinho
Resolvi que minha flor
[não vai ter espinho

Vou arrumar as chagas
Recortar cada lembrança de você
Vou libertar as mágoas
Relembrar todos os dias de esquecer

Resolvi por uma pedra no caminho
Resolvi contar os cacos bem baixinho
Resolvi dar uma chance pro vizinho
Resolvi que minha flor
[não vai ter espinho

28.5.08

40 anos

Acho, Não sei

Acho que cansei
Não tenho certeza
Sobram-me dúvidas,
Mas acho que cansei

Lutei por onde pude
Escrevi em pedra,
Recortei sorrisos
Mas acho que cansei

Ainda resta um bocado
Um pedaço de amor mal pago
Um soneto engasgado
Que não caberia aqui

Não, não vai ser soneto
Vai ser assim, com dois versos a mais
Um pequeno vestígio, uma dica
De que acho que cansei

Sim, a Gente Vai Levando

A gente vai levando
Ele já dizia
Mesmo com toda a lama que ele cria
Mesmo sem tanta chama como eu queria
A gente vai levando
A gente vai lavando
A gente vai deixando
Mesmo com toda a fama que ele dizia
Mesmo sem tantas falas como eu queria
A gente vai levando
A gente vai largando
A gente vai secando
Mesmo com toda a Brahma que ele bebia
Mesmo sem tanta alma como eu queria
A gente vai levando
A gente vai cantando
A gente vai usando
Mesmo com toda a cama que ele tinha
Mesmo sem toda trama que eu queria
A gente vai levando
A gente vai sugando
A gente vai amando

28.1.08

Sabe?

Procurei respostas em todos os cantos. Desde os pequenos cantos empoeirados do corredor até os nítidos campos da inspiração.
Procurei e ainda procuro saber o que me move, o que me leva, o que me toca e cega.
Ando procurando já há alguns anos, ando buscando explicações, explanações.
Nada. Ainda nada. Como se nadasse em um rio escuro e amarelo; limpo, porém escuro.
Nadando sempre em uma corrente de fluxo e temperaturas contínuas, que ora fazem a curva em perfeita harmonia, ora descem rápido rasgando as pedras e formando cachoeiras, pequenas sim, pequenas cascatas.
Em momentos se vê que a luz se esconde na água formando pequenos círculos deformados e dançantes. Em outros o acúmulo de pedras é maior, mas não interfere no nadar nem no equilíbrio se a intenção é descansar.
Pode sim ás vezes entristecer, mas interferir? Interferir jamais.
Ando procurando mais intensamente nestes meses, ando buscando alguma coisa, algum cheiro ou música que faça sentido.
Ando pintando telas, procurando nas cores algum raio místico que desperte alguma sensação.
Ando questionando o amor. Ainda acredito em sua existência sublime apenas em forma de espírito. Apenas como um querubim mimado e nada prático, que zomba e desfaz de tudo o que se constrói com o coração. Sim, o amor terreno é calculista, mental, quase um projeto de engenharia. É fruto de nossa arrogância, da disputa pelo poder. É birra. Agora quero, agora não quero mais.
Ando procurando resposta por viver em um mundo onde os dons são inferiores aos aprendizados mercadológicos. Me pergunto se ainda vale escrever, se ainda existe troca considerando que ninguém deve ler.
Busco na lua crescente, cheia, minguante, nova. Busco nas ondas do mar e principalmente nos respingos de ondas quebradas, aqueles que batem em nossos pés e sobem por nossas pernas molhando a saia.
Busco nos olhos tristes e felizes da minha cachorra, busco nas fotos do meu anjinho que já se foi. Busco nela, ela sim me contaria.
Busco nos dedinhos de um bebê que consegue com toda a sua força segurar apenas um dedo adulto. O único gesto sincero que conheço.
Ando procurando nestes dias de sol, ando procurando muito no rosto daqueles que acordam as 6 da manhã e enfrentam uma maratona urbana.
Ando procurando respostas para entender o sentido de ser quem sou, ando procurando remédios, remédios para pensar menos, procurar menos e enlouquecer mais devagar.
Ando procurando um novo caminho, algo que me invada novamente, que me tome de susto, que não me deixe nem ao menos questionar. Ando buscando alguém que me cative, alguém que me ilumine, alguém que apareça de repente, bruscamente e assassine todo esse procurar.
Ando procurando e esperando. Esperando o dia em que ela venha correndo, latindo e morrendo de saudades. Ela vai me contar, vai me dizer o porque disso tudo...e aí saberei que não preciso mais procurar.
Ouvi você dizer que não gosta, semana passada te vi na rima que se desdenha agora. Procuro algo que se pareça para que assim eu possa concluir alguma sentença, para que existam mais vírgulas e uma frase contínua.
Fica difícil definir tua casa, tua tribo, tua laia. Te vejo as vezes displicente, as vezes político, as vezes cru. Queria conhecer teus livros, teus discos, teus cadernos e rabiscos. Queria ver um álbum de infância, um uniforme velho e listrado.
Abrir a gaveta do criado-mudo e encontrar algo teu, mas um “teu” diferente, um “teu” que realmente lhe pertença. Algum sonho inenarrável, algum desejo escondido e um segredo de fazer rir.
Queria os tons da tua música preferida, uma carta velha guardada, um gosto, um desgosto e um afim.
Queria enfim saber se você existe, mas um “você” diferente, um “você” que realmente lhe pertença.

23.1.08

Tempo de partida. Tempo de chegada, encontro e mudança. Tempo. Tempo de vitória, revanche e chance.
Subindo a ladeira da eternidade composta pelos sinais que revelam meu destino. Sombras do passado que se transformam em suaves lembranças, e passado recente que perde a força que o mantinha vivo e dolorido.
Tempo de saída. Tirando o chapéu pra poucos e tirando o time de campo pra muitos. Nosso tempo sempre encontra um tempo para nos fazer parar e encontrar novas cores que substituem as cores desbotadas do quadro da parede. O tempo sempre nos transforma em pessoas duras e doces ao mesmo tempo.
O tempo te afogou em um lago longe o suficiente para que eu não consiga alcançar e que, por tamanha lonjura a preguiça me basta e o novo me convém.
O tempo nos faz perder um pouco do brilho que antes tínhamos para os olhos alheios, sendo assim, teu brilho se apagou um bocado significante para os meus olhos. Teus dons não me comovem mais e tua dificuldade construiu a muralha necessária para que se desista da guerra.
Desistir não é fracassar. Desistir é buscar o novo e deixar teu velho brilho ser novo para outro alguém ou para outro velho alguém.
Minha loucura não se compara com a tua, foi tua normalidade que me assustou e que me entristeceu por dias.
Se preciso de algo para ser quem sou? Sim. Preciso de chama, de luz e sombra, preciso de paixão em forma de pensamento e pensamento materializado. Preciso de seis sentidos e quem sabe sete, preciso de água fresca, pele, poesia e um bocadinho de dramaticidade. Enfim, nada disso encontro em ti. Que o tempo ajude então.

8.1.08

Conhecer os mascarados só me faz cultivar e redescobrir meu rosto!
Liberdade pra cair e assumir, liberdade pra fugir e estranhar, liberdade de investigar cada canto de um canto recolhido.
Medo não me invade a alma, medo seduz e instiga!
Medo não me invade a calma, medo apenas me afasta de quem não seduz!
Seduzir! Seduzir o verbo, a letra o escuro e a esfinge. Esfinge que ainda sonha em decifrar-me ou devorar-me.
Devorar-me? Falta-te tempo, lábia e capacidade. Mãos vazias de sentido em busca de um sentido qualquer pra se dizer que há.
Teus sentidos frágeis correm lentamente em busca de um nada vazio e assustadoramente fútil. Meu nada é cheio de rostos, casos, desejos, letras e rima.
Meu escuro é um guardião de luz e cheiros, temperos á base de terra cultivados nas areias da brasilidade.
Teu samba é frágil. Me assusta a falta de chico, tom, vinícius, noel, cartola.
Me assusta a batida da noite moderna, paga e incapaz.
Tua fuga apenas me salva de um mundo comum.

7.1.08

Escrever ou não? Pura compulsão. Vendo alegria na tristeza, vendo magia na certeza de uma ilusão. Cultivando minhas entranhas e confundindo as tuas. Viagem sólida, neurótica e transparente.

3.1.08



Preocupa-me o tempo que acreditei, que confessei, que reparti.
Dói ter caído em armadilha, como dói a um passarinho a arapuca. Não, não dói ter sido pega, presa, engaiolada. Dói ter acreditado, ter se iludido. Dói a vergonha de ter sido passarinho e não ter aproveitado pra voar.
Dói ter acreditado na surpresa da arapuca, sem saber que era arapuca. Dói não ter sabido.
Orgulho de passarinho ingênuo com asas cortadas.
Orgulho de quem sabe voar e agora não pode. Orgulho de quem errou e não pode admitir.
Assim, como quem cai na arapuca, como passarinho perdido e triste, assim que se aprende a rejeitar o humano; o podre lado humano.
Prefiro se passarinho em ilha deserta.

30.12.07

BRASILIDADE

ETERNA BRASILIDADE

ETERNA E ESTRANHA BRASILIDADE

ETERNA, ESTRANHA E DAS ENTRANHAS; BRASILIDADE


deixa

Me deixa morrer em teus braços
Em uma noite qualquer, antes
[ de qualquer dia
Me deixa esquecer-me em teu peito
Me deixa ser lua
Tua
Me deixa morrer em teu corpo
Em uma cama qualquer dentro
[ de qualquer noite
Deixa eu te respirar
Te inalar feito droga
Te fumar e te incubar em mim
deixa eu me matar com teu veneno
Em teu peito dormir
Em teus braços morrer
Em teu corpo nascer
Queria te lamber a pele
Te provar os pelos
Queria te morder os lábios
Te morder a pele
Queria te engolir em partes
Te devorar o medo
Queria teu peito em meus seios
Te provocar e te afogar em mim
Queria ter-te aqui dentro
Te machucar e curar em um mesmo instante

Queria te lamber a pele
Sentir o gosto
Queria te morder os lábios
Sentir a carne quente entre os meus dentes
Queria te engolir em partes
Sentir teus pedaços em mim
Queria teu peito em meus seios
Sentir teu peso me sufocar
Queria ter-te aqui dentro
Sentir que meu querer chegou ao fim

Soneto II

É em você que eu quero morrer
Dentro do teu peito e da tua boca
Como um segredo bem lá do passado
Como um soneto mal revisado

É em você que eu quero morrer
Um último suspiro na tua boca
Como brotar de um passado enterrado
Como o nirvana de um criador

É em você que eu quero morrer
Uma última palavra tua em meu ouvido
Um último deslizar de mãos e entrelaçar de dedos

É em você que eu quero morrer
Uma última palavra minha em teu caderno
Um último afago e entrelaçar de pernas

Soneto

Hoje morri um bocado
Perdi um pedaço, uma metade
Hoje escrevi mal, e além disso mal escrevi
Perdi um pedaço, uma metade de mim

Hoje chorei sentindo que algo apagou
Hoje pensei em voltar, em tentar
Mas faltou-me forças, perdi a vontade
E além da vontade, as vontades de ti

Hoje amarguei um bocado
Me senti mais banal, fugaz
Hoje escrevi mal e também mal de ti

Hoje faltou-me algo
Faltou-me inspiração, paixão
Hoje chorei vendo a dor do meu peito partir

28.12.07

Máscara, carcaça, vã filosofia, eterna demagogia.
Mascarados: Cuidado com o aquecimento global! - O calor derrete a cola.
Cuidado com os personagens precipitados e de precipício. Cuidado com a rima prática e conveniente, cuidado com as aspas, cuidado com sua alegria.
Cuidado com uma conversa convincente, uma frase roubada, uma música mal cantada. Mascarados, cuidado...um ato falho pode revelar, pode entregar, pode rasgar sua fantasia.

20.12.07

A língua do P: Palavra, Palco e Poesia
Soltando o verbo, soprando a letra, a rima, o repente. Falando baixo, falando alto, letra e gesto, luz e palco. Degustando cada verso, cada sina, cada artifício e desperdício de artista. Escrevendo um mundo paralelo, todinho pintado de verde e amarelo, todinho enfeitado com ar de mistério, todinho doído, teimoso, ácido e singelo.

12.12.07

Vem me contar um segredo
Vem me obrigar a guardar algo além de mim
Vem me somar, dividir
Me parte ao meio, inteiro
Dois inteiros de um
Vem retocar minha lembrança
Minha dança em teu peito
Meu leito, meu palco, meu jeito
Vem vestido de branco, de bata, de mala
Vem com verdade e saudade
Vem com fúria, sem medo e com alguma novidade.
Meta
Metamorfose
Forte
Um suspiro que anjo não escuta
Um tal dom de fazer doer, de fazer sentir
Uma força mais forte que meu forçar
Um buraco que se abre, que me chama, me seduz
Fugindo de mim, correndo em círculos
Fingindo pra mim, cada noite uma sentença
Cada dia um alívio e um desperdício
O caos, o caos me faz respirar
Liberdade de assumir um caos que assusta
Vontade de me comprimir em uma letra de bula
Um sonhar livre de medidas e novidade
Um viver livre de normalidade
Uma mente que mente pra mesma mente que inventa a mentira
Uma semente que só depois que seca germina
Uma ilusão que vira rotina
O caos, o caos que cria minhas manias
Brincadeira de viver igual ao que se pede
Fingindo existir. Observando, filmando a rotina
Retina, um olho que vê e inventa
Um suspiro que anjo duvida
Um tal dom de fazer sentir, de fazer doer
Uma força mais frágil que meu desistir.
Sabotei, sabotando o tempo. Insosso, tempo insosso de lembrar
Ignorei a noção do tempo e o vento fez a maré dançar
Feito onda e respingo na saia, feito nuvem e conchinha
Me criei com as fases da lua.
Na tua onda que o vento espirrou.
Tempo, o tempo é quem faz ventar
Vento, o vento é quem faz levar
Sabotei minhas palavras e as frases tuas.
Ignorei a mudança da lua, a conchinha e o mar
Me marquei de formas divinas, de uma divindade só minha
E atrás de um pecado só meu
Me livrei de nós e de casos, de futuro e passado
Me tranquei em meu peito, útero de mim
Me guardei por um tempo, um tempo e um vento
Me soprei como se solta a fumaça, leve e mais densa que o ar
Ainda me perturbo em cascas que viram templo ou prisão
Sabotei a vontade, a verdade, o personagem e a vazão
Saboto a razão de ser quando e onde
Saboto a ilusão de viver na roda-gigante
Sabotando laços e rindo da ilusão
Ainda me busco, de maneira mais ácida
Ironia minha ser quem sou
Buscando e sabotando o amargo e o opaco
Criticando críticas
Sabotando uma realidade cimentada
Sabotei, sabotando o tempo. Sabotei tudo o que vi e vivi
Em busca do que não pude sentir e sentindo o que não quero buscar.

4.12.07




Um bando de loucos.


Amo-te!
Amo-te mais que ontem e sem dúvidas, menos que amanhã. Amo-te sem esperar nada em troca, amo de cabeça baixa, coração apertado e pequeno pra tanta coisa.
Apenas amo-te! Eu nunca vou te abandonar.
Vestirei nossa camisa, nosso orgulho e em um futuro meus filhos cantarão teu hino.
Amo-te! Incondicionalmente. Amando devagar e insistentemente.
E esse nó na garganta vai passar, esse amargo, essa dor vai ficar doce e estável. Somos uma nação. Negra. Branca.
Somos um coração a cantar, cantando até ficar rouco.
Somos fortes. Somos muitos. Somos todos jogadores apostando contra o azar.
Amo-te! Amo tuas cores, teu pavilhão, tua história. Minha história, meu amor.
Somos uma nação temente e temida. Somos o contra. Somos a tristeza e a felicidade.
Somos um turbilhão, uma explosão invejada. Somos a democracia, somos a invasão.
Invadimos estádios, cidades, países. Invadimos!
Chegamos como onda e nosso nome arrepia.
Somos leais, somos fiéis. Vivemos por ti. Somos a festa, a união. Somos lágrimas sinceras, presentes em qualquer posição de uma tabela.
Somos intensos. Somos um exército.
Amo-te mais que imaginei, mais que sempre, mais que nunca.
Amo-te assim como és. Porque és gigante. Sólido.
Saiba, não tenha dúvidas: Somos loucos por ti Corinthians!

29.11.07

Desata esse nó menina! Desata o nó e os “nós” que povoaram seu coração.
Foge. Encerra este ciclo falido e fracassado. Volta e envolve quem merece, quem regresse, quem desperte.
Anular, deletar, formatar.
Foge. Muitos caminhos se mostram a todo instante, um melhor que o outro, um mais lírico que o um anterior. Desatando nós.
Assim, puxando a corda pro lado que dói menos. Já é tarde. Já é novembro.
Já passou a lua cheia, já passou a vontade, a saudade e a temperança.
Maldade...o Desconcerto do mundo, já dizia Camões.
E vai reparar só agora? Mais claro que neblina!!
Foge, cruza o Atlântico logo! Deixa apenas nó de marinheiro, nó de candomblé, deixa apenas este regionalismo lindo não esquecer quem você é. Leva tudo na bagagem, no baú, no pensamento ativo e desativo.
Apenas leva para voltar de vez quando voltar.
Agora? Agorinha? Só foge! E esquece! O tempo já tratou de esfriar e tudo o que é frio se esquece num dia quente de verão.

21.11.07

E mais uma vez a pergunta volta, aliás quem seria eu sem um ponto de interrogação? Quem seríamos nós? E por fim, quem somos nós?
É amigo, não adianta perguntar de onde viemos, para onde vamos se não sabemos ao menos quem somos nós.
Somos um misturado de matéria já retocada (por nós mesmos) e um possível grau de espiritualidade. Somos seres que se cobrem, por frio, vergonha ou moda. Pessoas que passeiam, se escondem, moram e namoram.
Somos as vezes um casal, uma alma gêmea ou um solteiro carente em uma sexta-feira de verão. Somos um folião típico de carnaval ou um boemio em tempo integral, depende do espírito, da qualidade da matéria ou do nível de solteirisse.
Somos membros de uma sociedade que por incompetência deveria ser uma sociedade secreta, assim esconderíamos nossa vergonha.
Somos corpos. Somos mente, uma máquina capaz de arquivar lembranças, imagens, cheiros e sensações,mas que as vezes se esquece do nome do fulano ou a senha de um novo cadastro.
Somos quem gosta de andar na chuva ou detesta se molhar, somos quem samba e quem adora internacionalizar, somos artistas amigo!
Mentes altamente criativas.
Somos quem foge do mundo para tentar entender nosso próprio avesso, nossas tripas, nosso coração apavorado e ansioso.
Somos quem move e quem por vezes se deixa levar, somos quem canta no chuveiro e quem chora no travesseiro...é amigo, somos quem espera o mundo rodar, de pileque ou não.
Somos o que queremos ser, me diz qual seu personagem preferido, sua máscara favorita e seu nome de super-herói. Me conta quantos rabiscos e desenhos fabulosos você já fez, quantas vezes imaginou histórias e sonhou acordado...
É amigo, somos quem somos em essência mas não somos donos do tempo...ele também é o que quiser...
Um conselho, meu amigo? Voe o mais alto que puder. Voe o mais rápido e o mais intenso que puder, não rumo á uma carreira de sucesso, regada a promoções e prêmios, rumo aos teus dons.
Vasculhe tuas entranhas. Quais são eles? Quantos são.
Somos todos iguais, sim somos. Mas em níveis diferentes de idas e vindas. Meu amigo, é nítido: você tem asas. Deixe-se voar.
Busque um palco ou uma prancheta o mais rápido possível, busque um amor inesquecível e uma fantasia pra se esconder.
Se esconder apenas do medo...porque do resto é maldade. Já passa da hora de ser aplaudido de pé.Vai amigo, não tarda em acordar, não demora pra voar...já é primavera.
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