--Olha pra mim. Apenas olha e me diz. Tudo em vão?
Ela acordou, foi um sonho. Só mais um sonho? O mesmo sonho das últimas semanas.
Levantou-se, sentou-se na cama e esticou o braço até a escrivaninha onde estavam os cigarros e fósforos.
Agora era a vez da fumaça. Um feixe de luz entrava pela janela, uma luz azul, neon do bar no térreo. A fumaça dançava pela luz azul, a fumaça se tornava luz. Luz azul.
Cada tragada aumentava a sensação de vazio e medo. As cinzas iam para o resto de cuba libre no copo de vidro mesmo.
Que horas seriam? 4h10 da manhã. Ela tinha medo, medo dela mesma. Seus pensamentos eram rápidos demais.
- Água! Preciso de água!
A água era insossa para ela. Atacou o whisky. Mais um cigarro e um comprimido. Dor de cabeça, a mesma dor de cabeça das últimas semanas. Mais outro comprimido, um só não iria adiantar.
Abriu a porta e desceu a escada de madeira escura e úmida, nada se via, mais uma vez a lâmpada havia queimado. Chegou até a calçada. Fria, a calçada era fria e ela sempre descalça. Olhou para o bar, sentiu uma imensa vontade de atirar uma pedra no letreiro azul que há anos lhe incomodava. Pensou em entrar.
- Descalça? Droga, to descalça...
Sentou-se na guia da calçada então e acendeu mais um cigarro. Agora a fumaça era apenas cinza, um cinza clarinho, quase branco. Subia. Ela queria subir. Acho que ela queria ser fumaça.
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"Se apenas houvesse uma única verdade, não poderiam pintar-se cem telas sobre o mesmo tema".